• Home
  • Posts RSS
  • Comments RSS
  • Edit
  • Chapter 4...

    terça-feira, 1 de setembro de 2009

    "Acende um cigarro. Fuma muito, considera-se fumadora compulsiva. Sabe que é mau para a voz e a saúde e tem certeza que não se quer tornar um dia numa quarentona de cigarro nos lábios, no entanto não teve coragem ainda para deixar. Fuma a qualquer hora do dia ou da noite, chegando por vezes a pensar em fumar um cigarro quando na verdade já tem um aceso. Não sabe porque começou a fumar. Não saberia dar uma explicação se lha pedissem.
    Não sabe taopouco porque começou a mutilar-se. Pensa nisso frequentemente. Tenta voltar à primeira vez que o fez e lembra-se na perfeição desse dia. Lembra-se onde foi buscar essa ideia, no entanto não saberia explicar porque o começou a fazer.
    "Existem tantas coisas que fazemos sem sabermos porquê, sem sabermos porque ganhámos esse hábito que parece posteriormente tão dificil de abandonar", pensa. Sabe no entanto que a auto-mutilação não é um mero hábito, é uma doença, embora não goste de lhe dar esse nome. Não se sente doente. Sente-se por vezes anormal, não doente.
    Aborrece-se por vezes profundamente ao pensar nisso e ao tentar entender porque tem de ser sempre diferente. A diferença em si não a aborrece, na verdade adora a diferença e gosta de marcar por ela. Ainda assim, certas diferenças, tal como essa, não lhe agradam, embora saiba que a existência desse problema depende só e unicamente dela.
    Chateia-se também por vezes por nunca ter sabido guardar esse segredo e ter sempre partilhado com algumas pessoas. Não considera que o deveria ter escondido por ser uma vergonha mas sim para não envolver outras pessoas nisso. Sabe que os seus amigos e quem é mais próximo dela não esquecem essa faceta dela e preocupam-se obviamente com o seu bem-estar. Acha tremendamente injusto e egoísta o facto de contar a quem quer que seja que pratica ou praticou auto-mutilação.
    "Mutilaçao"... Essa palavra parece-lhe sempre demasiado forte, pois muito embora saiba que ao amgoar-se está de facto a mutilar-se, continua a ter a ideia de que é algo controlado e de que nunca chegaria a magoar-se de forma perigosa para si mesma. Mas no fundo, sabe que é mentira. Sabe que após vários meses "limpa", as coisas parecem-lhe sempre menos graves, parece-lhe sempre que nunca houve perigo. No entanto, voltando a cada momento específico, consegue reconhecer o perigo, consegue reconhecer que poderia ter vacilado e posto a sua vida em perigo.
    Não sabe como chegou a esse ponto. "Por fraqueza! Por estupidez! Por cobardia!", pensa ela automaticamente com uma certa raiva. Tem por hábito contar os dias desde o último corte, da última ferida. Deixa-a mais descansada, embora sempre que chega ao limite, ao máximo de tempo que esteve "limpa", começa a sentir uma certa pressão, sempre com receio de falhar mais uma vez.
    O que mais a irrita é falhar, não a ela própria mas aos outros. Dói-lhe profundamente sempre que pára para pensar nas pessoas que magoou ao longo do tempo por causa dessa sua prática. E tem um medo pânico de voltar a falhar a essas pessoas, de voltar a pô-las numa situação de dor, de aflição. Todos esses medos são uma pressão enorme que criam um ciclo vicioso na sua mente. Ao recear, sente-se mal consigo própria, e ao sentir-se mal consigo própria, cria as condições "ideias" para uma nova falha. Sabe que na base de qualquer uma das suas feridas, esteve um sentimento profundo de mau estar, de ódio de si própria, e por isso receia pensar numa nova falha. É-lhe no entanto impossível esquecer.
    Acende outro cigarro. Ignora o calor do isqueiro e volta aos seus pensamentos rotineiros."


    0 comentários:

    Blogs que eu sigo